Justiça climática para imaginar outros caminhos de futuro
Rassemblement de mouvements sociaux lors de la pré-COP Juventude das florestas organisée par les Gardiens du Bien-vivre, en mai 2025 © Guilherme Firmino, FEFACCION
O essencial
- Desde os anos 2000, vários milhares de queixas relacionadas ao clima foram apresentadas em todo o mundo, inclusive por países ameaçados de submersão. Mas mais do que uma abordagem legal, "justiça climática" também se refere a abordagens éticas e políticas.
- Entre os proponentes desse conceito estão os Guardiões do Bem Viver no Brasil. Esse coletivo exige a liberdade de escolher seu próprio caminho de desenvolvimento, uma escolha que agora é dificultada pelas mudanças climáticas para as quais eles não contribuíram.
- Na COP30, que começa em 10 de novembro no Brasil, vários países levantarão a questão do financiamento de iniciativas sustentáveis.
"Por trás da noção de justiça climática, há a observação de uma injustiça : as populações que se adaptam e buscam soluções para as mudanças climáticas são também as que mais sofrem, embora quase não contribuam para essas mudanças". Emilie Coudel é socioeconomista do CIRAD. A pesquisadora trabalha com organizações de agricultores no Brasil há várias décadas. "Estamos testemunhando uma lacuna que está se tornando cada vez mais insuportável. Nos últimos quinze anos, as populações rurais têm sido pressionadas a encontrar sistemas de produção capazes de se adaptar às mudanças climáticas. Por exemplo, a agrossilvicultura é promovida por sua resiliência, exceto que as mudanças climáticas são tão fortes que mesmo os sistemas agroflorestais não conseguem acompanhar. »
Recentemente, a Amazônia sofreu duas secas extremas, que costumavam ocorrer apenas uma vez por século. Muitas árvores morreram. A violência dos choques climáticos está cortando pela raiz as tentativas de adaptação das populações que são as primeiras a conservar os recursos florestais.
Nesse contexto, muitas comunidades estão exigindo seu direito à reparação. Mas, mais do que reparações, trata-se de que esses movimentos garantam que tenham a oportunidade de desenvolver estilos de vida que lhes convêm.
Justiça climática, um conceito operacional para pensar o futuro: exemplo do coletivo Guardiões do Bem Viver
Por meio de demandas por justiça climática, as comunidades amazônicas estão reinventando um quadro de ação que vai além da questão ambiental, abrindo caminho para uma reflexão mais ampla sobre desigualdades sociais, distribuição de terras e questões de reforma agrária. É o que está fazendo o coletivo de jovens amazonenses chamados de "Guardiões do Bem Viver", que buscam defender seu modo de vida e seu território do Lago Grande, na região de Santarém, diante da chegada de empresas de mineração e extração de madeira. Desde 2019, este coletivo realiza ações de sensibilização, formação e mobilização para as comunidades do território para defender a sua visão de justiça climática, que definem como "a garantia dos direitos historicamente reivindicados pelos povos que são os verdadeiros guardiões da natureza".
Durante as oficinas de antecipação territorial realizadas no âmbito do projeto JUNTES e da tese de doutoramento de Beatriz Abreu dos Santos, o coletivo imaginou um cenário de justiça climática para o seu território e definiu um conjunto de ações prioritárias para alcançar este futuro. " Nesse cenário, a terra das diferentes comunidades locais é demarcada e reconhecida", explica Beatriz Abreu dos Santos. A agricultura familiar garante a segurança alimentar, é fundada uma Universidade do Bem Viver local, o turismo sustentável é desenvolvido, o rio é reconhecido como sujeito de direito e o estabelecimento de atores e empresas considerados predatórios foi proibido por decisão judicial. »
Entre as ações prioritárias definidas, é possível distinguir entre iniciativas voltadas para o fortalecimento das comunidades rurais e da cultura, que o coletivo já realiza em seu território, e medidas estruturais que exigem forte presença do Estado e criação de políticas públicas. Esta distinção põe em evidência os limites da ação comunitária face aos desafios estruturais. A justiça climática implica uma responsabilidade compartilhada, onde o Estado e os mecanismos de financiamento público garantem a continuidade e sustentabilidade dos esforços realizados a partir dos territórios.
Fortes parcerias entre a pesquisa brasileira e francesa e a sociedade civil
A tese de Beatriz Abreu dos Santos foi coorientada por Stéphanie Nasuti, da Universidade de Brasília, e Emilie Coudel e Marc Piraux, do CIRAD. JUNTES, é usado aqui no diminutivo de " Jovens Vivos Tecendo Conhecimentos ". Trata-se de uma parceria entre o Coletivo de juventudes "Guardiões do Bem-viver", a Universidade de Brasília, o IRD, a Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), a Fundação Getúlio Vargas (FGV-CES) e a ONG Sapopema.
Durante a COP30, que acontecerá em novembro em Belém, espera-se uma forte mobilização da sociedade civil e, em particular, das várias comunidades amazônicas, exigindo ações concretas e justiça climática real.
Como podemos financiar os territórios que fornecem soluções de desenvolvimento sustentável?
Sem a criação de financiamento global, redistribuído pelos territórios, não é possível garantir um desenvolvimento sustentável e inclusivo. O Brasil, sob a liderança do presidente Lula, posicionou-se como líder dos países do Sul Global para convocar as nações historicamente responsáveis pelo aquecimento global a contribuir de forma equitativa para os esforços de transição.
Um dos mecanismos propostos que serão lançados durante a COP30 é o Tropical Forests Forever Facility (TFFF), um fundo destinado a pagar pela preservação das florestas tropicais. O TFFF prevê que pelo menos 20% dos fundos recebidos pelos países beneficiários sejam devolvidos diretamente aos povos indígenas e comunidades locais. Enquanto o Brasil destinará um bilhão de dólares a esse fundo, o presidente Lula pede aos países mais ricos que contribuam para que ele atinja o valor mínimo de 25 bilhões de dólares necessários para sua ativação.
Esta iniciativa ilustra a vontade de inventar novos mecanismos de financiamento, baseados na protecção dos bens comuns e não na sua exploração. Para alcançar a justiça climática, precisamos repensar a economia global, onde a solidariedade se torna o motor de um futuro sustentável.